Frases Gerais

Os ignorantes gostam de ser snobes porque também eles respeitam mais os snobes. Veem um ignorante igual a eles, mas exacerbando maneirismos, e de pronto pensam de si para si: «Este tipo, afinal, é seleto.» Os ignorantes aprendem depressa a palavra «seleto». É outra das suas ferramentas para serem seletos. Ou snobes.

Onde quer que haja mais de dois homens, há também duas capelinhas, formadas e desfeitas ao sabor dos pactos de circunstâncias e das susceptibilidades acumuladas.

As pessoas dão uma importância à verdade que ela não tem.

O inferno são os outros, dizia Sartre, o supremo filósofo pós-freudiano. O inferno são os outros, tanto quanto nós próprios – e em nós habitam tanto o Inferno como o Céu. Todo o Bem, como de resto todo o Mal, está no Homem – e permanecerão ambos no Homem quando um dia, como é inevitável, ele for contagiado.

As crianças, nem é preciso dizê-lo, são crudelíssimas. Nascem selvagens, infinitamente mais mesquinhas do que pretendeu Rousseau – e naquelas idades, desprovidas tantas vezes dos mais básicos códigos de socialização (que muitas não chegarão a integrar), estão ainda perigosamente próximas da irracionalidade absoluta.

Trazemos conosco isto de que ser português é ser mesquinho, pobres de espírito, egoísta – e, quando se trata de falar dos “portugueses em geral”, nunca somos um deles. Curiosidade: o hábito não é especialmente lusitano.

Um homem passa por tudo: coisas boas e coisas más, casamentos e divórcios, nascimentos e mortes – e não consegue, no fim, construir um olhar suficientemente irónico que o livre do azedume? Ou é estúpido ou a vida foi-lhe especialmente ingrata – e, como três quartos dos velhos maus que conheço são pelo menos de classe média, portanto fundamentalmente ricos, eu começava a confiar mais na primeira hipótese.

É uma vingança (…) E movida pelo amor, que é a espécie mais devastadora.

Para uma certa categoria de pobres diabos, já se sabe, a arrogância revela-se muitas vezes uma ferramenta de enorme utilidade. Em Lisboa, pelo menos, é assim: uma pessoa pode ser modesta, ignorante e frágil, mas se puser um ar de superioridade ganha logo ascendente na relação com a pessoa em frente.

Nós nunca sabemos bem o que a nossa memória vai reter – e não raras vezes damos por nós surpreendidos com uma recordação inútil, tirada de um filme série B ou apenas de um dia sem inspiração (mas que, apesar disso, nos repovoa sempre que determinada situação se repete).

Pensando bem, a mais ténue fronteira entre a sanidade e a loucura não poderá traçar-se noutro lugar senão aí mesmo: na possibilidade de, para além de tudo o mais, um homem continuar a admirar o seu pai. Pobres daqueles que não o consigam nunca.

No fundo, era tudo tão maquinal e coreografado, tudo tão simples e ingénuo, que já não podia ofender ninguém, aquele primeiro ato da nossa farsa anual. Mas a verdade é que por detrás da comédia se ocultavam mágoas antigas, demasiado antigas – e que, nessas mágoas, todos éramos, ao mesmo tempo, vítimas e algozes. Cada família seu manicômio, dizia o povo, e talvez até o dissesse bem.

O facto é que as emoções dos pobres eram mais francas, mais gratuitas e inapeláveis – e que, de cada vez que eu o recapitulava, lembrava-me da minha própria família.

Toda a ilha é um continente.

[Futebol] É uma fórmula, o pênalti. Uma equação com três parcelas: força, colocação e dissimulação. Observar duas delas é sempre suficiente para penetrar nos jardins do Olimpo. Um pênalti marcado com força, bem colocado, e em que o guarda redes seja enganado, entra sempre. Mas um pênalti forte e colocado também entra, mesmo sem dissimulação. Um pênalti dissimulado e forte sobreviverá sem colocação. E um pênalti colocado e dissimulado é sempre golo, ainda que não tenha muita força. É a ciência ao serviço da arte. Sim: o pênalti é o mínimo múltiplo comum entre arte e ciência.

Gosto de uma mulher com defeitos – e um ponderado excesso de carnes, às vezes, é o mais belo deles. Bem vistas as coisas, a formosura pode conviver com a gordura. O que não pode nunca é conviver com a transparência, com a falta de história, com a ausência de profundidade.

No que se transformaria um homem obrigado a viver sem a mulher que ama? – perguntou-se, e achou que nenhuma outra pergunta resumia tão bem tudo o que tinha aprendido sobre si mesmo e sobre a espécie.

A culpa é uma coisa extraordinária. No limite, até somos capazes de confundi-la com amor.

Não tinha exatamente saudades deles: tinha talvez saudades do que eu próprio era na presença deles, desse miúdo rebelde e terno que o tempo e a América e a morte e a perda da inocência e o tédio, no seu sempre infernal encolher de ombros, se haviam encarregado de adestrar.

A História enferma com demasiada frequência do impulso de transformar em números e tendências as rugosidades, as assimetrias e os paladares.

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